2 de fevereiro de 2009

Saudade

Durante, quase oito anos, trabalhei no número catorze da Rua Cidade de Cádiz. Numa distribuidora de livros. Os livros, a minha perdição. Era uma empresa pequena, familiar, mas com muita confusão. Sem janelas, nem ventilação, tinha apenas uma enorme porta de vidro martelado. Adorava trabalhar ali. E não teria as colecções completas que tenho, se não o tivesse feito. Lembro-me do cheiro dos livros, empilhados até ao tecto; da chegada das ansiadas novidades, umas mais badaladas que outras; a loucura da época escolar; da gritaria (muito se gritava naquela empresa); das loucuras da gerente; dos vendedores, que só apareciam à sexta-feira para almoçarmos todos juntos, na “tasca”. Foi lá que aprendi a trabalhar. As responsabilidades e obrigações. A saber organizar-me e trabalhar em equipa. A lidar com clientes e fornecedores, com pessoas mais ou menos honestas, com gente normal e gente louca (oh, e como imperava a insanidade mental). Criei amizades, tive chatices, vivi mil e uma peripécias, perdi pessoas de quem gostava, ri muito e também chorei. Ajudou-me a crescer. Desde que de lá saí, já passaram outros oito anos, se lá fui quatro vezes, foram muitas. As pessoas foram saindo e as visitas deixaram de fazer sentido. A dada altura, a empresa mudou de instalações e acabou por falir. No fim-de-semana passado, estive por ali e não resisti. Acho que, há mais de cinco anos que não entrava naquela rua. Estacionei o carro no “sítio do costume”. No sítio onde aprendi a trabalhar, está agora uma frutaria. Autocolantes enormes, de maçãs verdes, tapam a porta de vidro. Fiquei por ali, uns minutos, sozinha. E deixei-me levar pelas memórias e pela saudade.

3 comentários:

  1. Trabalhas há, pelo menos, 16 anos? Foste uma das vítimas do trabalho infantil?

    beijo

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  2. Ah, pois é! Desde os 17 anos! Sou uma desgraçada! :P

    Sou mais vítima do meu orgulho e nariz empinado! :)

    Beijo.

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  3. Como o crescer,o tempo e o distanciar dos acontecimentos mudam as nossas opiniões e as nossas certezas.E todos os dias crescemos.
    Lindo!
    Eu

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